no capítulo Identidade
− Contraidentidade do Design do livro Design, Cultura e Sociedade, Gui Bonsiepe fala de algumas perspectivas do artesanato.
O uso de recursos locais (motivos gráficos, combinações cromáticas, materiais e processos de produção intensivos em mão–de-obra) em relação ao design e criação da identidade pode ser visto de maneira exemplar em países periféricos. Em grande parte, essas atividades pertencem ao setor informal da economia e aplicam, em geral, processos não intensivos em capital. Frente ao tema artesanato e design, podemos detectar as seguintes posturas que aparecem em forma pura ou misturada:
1 o enfoque conservador. Procura proteger o artesão contra qualquer influência do design vinda de fora. Esta postura se encontra ocasionalmente entre antropólogos que rejeitam qualquer aproximação entre design e artesão, pois querem manter o artesão em estado puro, imaculado e resistente contra influências contemporâneas. (...)
2 o enfoque estetizante. Considera os artesãos representantes da cultura popular e eleva seus trabalhos ao status de arte, utilizando o termo “arte popular” em referência a “arte culta”. Às vezes se usa o repertório das formas da arte popular (ornamentos, combinações cromáticas) como ponto de partida ou fonte de inspiração quando representantes de fora, estranhos às comunidades, tratam de imitar a linguagem formal-estética para fins de design. Concretamente este enfoque se manifesta no chamado ethnodesign;
3 o enfoque produtivista. Considera os artesãos como mão-de-obra qualificada barata, utilizando suas capacidades para produzir designs desenvolvidos e assinados pelos designers e artistas. Requer uma boa medida de ingenuidade ou frescura quando esse enfoque, apresentado como “ajuda” para o artesanato na periferia, é recomendado por motivos de interesses humanitários a fim de produzir designs “inspirados” pela cultura popular local ou designs diretamente trazidos do centro com mão-de-obra barata nessas comunidades. Tal prática do design perpetuaria as relações de dependência em vez de contribuir para sua superação;
4 o enfoque culturalista ou essencialista. Considera os projetos locais dos artesãos como base ou ponto de partida para o que seria denominado como verdadeiro design latino-americano ou indo-americano. Às vezes este enfoque vem acompanhado de uma postura romântica que idealiza o suposto passado “bucólico”;
5 o enfoque paternalista. Considera os artesãos em primeiro lugar como clientela política para programas assistenciais e exerce uma função mediadora entre os produtores e a comercialização (marketing), em geral com altas margens de lucros para os vendedores;
6 o enfoque promotor da inovação. Advoga a autonomia dos artesãos para melhorar suas condições de subsistência, muitas vezes precárias. Neste caso, é necessária a participação ativa dos produtores.
trata-se de uma questão bastante polêmica. no nosso projeto, temos como ideal o enfoque promotor da inovação, apesar de termos consciência da sua dificuldade de aplicação (talvez pela nossa inexperiência) e da incerteza quanto ao nosso papel no processo.
quando se refere à manifestação de identidade do design, o autor apresenta cinco modos de sua materialização:
− em forma de um grupo de características formais ou cromáticas (stilemi);
− na estrutura da taxonomia dos produtos, os tipos de produtos característicos para uma cultura, por exemplo, uma cuia de cabaça que foi criada na cultura guarani;
− no uso de materiais locais e métodos de fabricação correspondentes;
− na aplicação de um método projetual específico (empatia por uma tradição e uso desses atributos arraigados em determinada região).
além disso, o autor expõe a importância da relação com o ambiente e a natureza para o artesanato, que vai além dos problemas de subsistência. muitas tradições e lendas surgem a partir de motivos de fauna, flora e astronomia, e depois se materializam nos produtos. a destruição da natureza passa a ser, assim, também uma ameaça para a continuidade dessa cultura. tal questão é diretamente aplicável ao artesanato produzido na região em que o nosso projeto se insere. o cerrado é uma das maiores inspirações para os artesãos locais, muitos deles provenientes de diferentes partes do território nacional.
BONSIEPE, Gui. Design, Cultura e Sociedade. São Paulo: Blucher, 2011.